domingo, 28 de março de 2010

POESIA-COMPROMISSO DA TERRA-Berenice

Compromisso Terra

Berenice Gehlen Adams



Grande ser do universo: Terra

De infinitas faces

De infinitas formas de vida

De infinitas histórias e aventuras

Hoje

Com teu corpo doído e sofrido

Com teu sangue corrompido e manchado

Com tua pele machucada e queimada

Ainda persistes em acolher bem

O teu filho predador

Que é também predador de si próprio

Hoje é nosso dever

Assumirmos contigo

O compromisso de te cuidar

De te recuperar, de te regenerar

A começar pela própria regeneração humana.



Por que a humanidade está cega

Pelas promessas

Das modernas ciências do saber

Que reconhecem, timidamente, a sua pequenez

Por não encontrarem alternativas

Para curar o mal causado a ti

E a todas as formas de vida que tu abrigas.



E é por teu amor incondicional

Que transcende a compreensão humana

Que assumimos o compromisso

De gritar por ti clamando alteridade,

caridade, amorosidade, respeito.



Terra

Grande ser do universo

A ti pedimos perdão

Pela nossa insensatez

Assumimos hoje

De forma individual e global

O compromisso de resgatar

A consciência integral

Para que cada ação nossa colabore

Para o nascimento de uma nova humanidade

Que te respeite, que te honre,

Que te ame verdadeiramente.



Salve, Terra!

Projeto Apoema - Educação Ambiental

www.apoema.com.br

LEONARDO BOFF-CARTA DA TERRA

Texto inédito: Palestra de Leonardo Boff - Agenda 21/ Fórum Social Mundial 2005
Transcrita por Pedro Adams Júnior e Berenice Gehlen Adams
Fotos: Pedro Adams Júnior
Realizada no dia 27 de janeiro de 2005.
Apresentação da transcrição: Leonardo Boff, representante da Comissão da Carta da Terra, vem ao Fórum Social Mundial de 2005 falar sobre a importância do documento, como ele foi elaborado, e faz um apelo para a utilização da Carta da Terra como instrumento de sensibilização para o nascimento de uma sociedade sustentável. Com vocês, Leonardo Boff:
A Carta da Terra fala do mistério de todas as coisas, mistério do universo, o mistério que nos assinala o nosso lugar no conjunto das criaturas. Pois, este mistério tem muitos nomes, uns chamam de Alá, de Tao, de Deus, de Amor, tão importante como o documento, a Carta da Terra tem lá seu lugar reservado para esta dimensão mística da ecologia.
Bom, eu queria dizer... fazer algumas reflexões sobre a ética e a proposta da Carta da Terra. O Pedro Ivo já fez uma boa introdução, mas deixa-me explicar um pouquinho o por que desta Carta da Terra, como ela surgiu e qual é o significado para todos nós que buscamos uma compreensão ecológica mais mística, mais integradora das dimensões do ser humano e da natureza. Na Eco-92 estava prevista uma Carta da Terra que devia servir de suporte teórico para a Agenda 21, mas não havia consenso entre os representantes, talvez não havia acumulação de consciência sobre a importância de uma visão mais completa da natureza, do planeta Terra e da humanidade... não foi aceita, e aí ficou a Agenda 21 e a Declaração do Rio de Janeiro sobre desenvolvimento e meio ambiente. Mas, pessoas importantes que trabalhavam a questão da Carta da Terra não aceitaram, antes se inclinaram contra isso, e lá mesmo, no final da Eco-92, decidiram criar uma articulação para preparar uma Carta da Terra. O primeiro foi Mikhail Gorbachev, que criou uma grande ONG chamada Cruz Verde Internacional, e um dos organizadores da Eco-92, que é o Canadense Maurice Strong, que é sub-secretário da ONU, então eles convidaram algumas pessoas, e eu entrei nesse rol, para articularmos, das várias partes dos continentes do mundo, uma reflexão que viesse de baixo, das populações, das favelas, dos indígenas, dos centros de pesquisas das tradições espirituais, que viesse uma visão sobre a Carta da Terra. Detidamente trabalhamos de 1992 até 2000, mobilizando mais de 100.000 pessoas, mais de 40 países, para refletirmos sobre o que nós queremos com a casa que moramos. Então, a cada continente pessoas se encontram até que, em fevereiro de 2000, no espaço da UNESCO, em Paris, chegamos a um texto de convergência, depois de muito estudo, correção, voltando as bases, chegamos a um texto que fosse um texto aberto para ser enriquecido, ainda. Imediatamente a UNESCO assumiu para divulgá-lo nas escolas, e para ajudar a criar uma consciência nova e uma compreensão mais vasta da ecologia, até chegarmos ao ponto de que esse documento seja apresentado na agenda da ONU e estudado, aprofundado, e, se aprovado, fosse incorporado à Carta dos Direitos Humanos. Aí, então, teríamos um quadro mais completo da dignidade, não só da dignidade humana - e a Carta dos Direitos Humanos é antropocêntrica, só considera o ser humano, mas nós não somos os únicos filhos e filhas da Terra. Não somos só nós que usamos a biosfera. Todos os seres vivos, as plantas os animais, os micro-organismos, também são irmãos e irmãs nossos. Eles têm direitos. A Terra como planeta tem dignidade, então se trataria de completar essa visão de dignidade, que nós fazemos votos com essa divulgação - vocês receberam a Carta da Terra aí no material de vocês, para vocês divulgarem isso. Ela pode caber, toda a Carta da Terra, num folheto como esse, para se levar para as comunidades, para as escolas, para os grupos, para lentamente incorporarem essa visão, e darmos um salto no nosso estado de consciência, para o nosso cuidado, a nossa responsabilidade, para o futuro comum: terra e humanidade.
Também queria apresentar um pouco o conteúdo dessa carta, depois vocês podem ler mesmo na própria carta, para ressaltar a importância desse documento, que é um documento mundial, e não só de grupos, mas que quer representar a parte melhor do engajamento ecológico mundial.
O documento parte de uma visão, eu diria a mais avançada do discurso ecológico, no sentido de superar a visão meramente ambiental, que fala de meio ambiente. Na verdade nós estamos cansados de meio ambiente, o que nós queremos é o ambiente inteiro, isto é, a visão que englobe mais dimensões (Aplausos). Então, esse documento assimilou os pontos de maior consenso na discussão e consciência ecológica mundial e transformou num conteúdo pedagógico extremamente simples na linguagem, para poder ser compreendido e assimilado, e parte de numa dimensão de urgência. Não é documento que a gente faz porque é interessante, é bom, ajuda a discussão.
Então, a primeira frase do documento, abrindo o documento, que foi a frase extremamente discutida, que convocamos grandes nomes da ciência mundial para dizer: podemos dizer isso ou é alarmismo? Ou é uma visão excessiva do alarme ecológico? E a grande maioria dos centros que estudam o estado da terra, o pensamento crítico e sério da ciência, disseram: podem dizer. A frase começa assim: “Estamos num momento critico na história da humanidade, o momento que a humanidade deve decidir o seu futuro, deve escolher o seu futuro, e a escolha é essa: ou formar uma aliança de cuidado do planeta, de cuidarmos uns dos outros e da vida, ou arriscar a nossa extinção e a devastação da diversidade da vida”. Então, essa é uma realidade de urgência. Nós estamos sob uma crise que pode se transformar numa tragédia. É crise que nos obriga a “crisolar” as nossas práticas, a nossa compreensão, para preservar esse patrimônio que o universo nos entregou em 15 bilhões de anos de trabalho, hoje quase 4 bilhões de trabalho do sistema da vida. Nós herdamos tudo isso. Podemos destruí-la, podemos ser o Satã da Terra, mas nós queremos ser um anjo bom, que cuida, que protege a Terra, que passa avante, enriquecido, esse patrimônio. Então, o contexto é dessa urgência. Daí a importância desse documento na criação de uma nova consciência e de práticas alternativas mais globais com o sistema da vida.
O documento também procura superar essa visão que fala, como disse antes, de meio ambiente. O documento parte da convicção de que aquilo que de fato existe é comunidade de vida. Nós formamos uma comunidade com muitos irmãos e irmãs, primos, porque todos os seres vivos, outrora e hoje, têm o mesmo alfabeto genético. Temos os mesmos 20 aminoácidos e as mesmas 4 bases fosfatais. As formigas, as minhocas, os cavalos, os colibris, e nós, então somos irmãos e irmãs. Há um laço de parentesco, diz o documento, entre todos nós. Então, superada essa visão fechada sobre nós, abrimo-nos para a grande comunidade de vida, para uma democracia sócio-cósmica que envolve todos os seres vivos.
O documento, em segundo lugar, tenta superar aquilo que está em todos os documentos oficiais dos governos, da ONU e também da nossa linguagem. Procura superar o conceito de desenvolvimento sustentável. Fizemos discussões homéricas no interior dos nossos encontros. Por quê? Porque esse desenvolvimento, do que se trata - foi lido já hoje de manhã - ele é insustentável. Ele não tem sustentabilidade. Então, para garantirmos o futuro do planeta e da humanidade temos que garantir, sim, a sustentabilidade do planeta, da vida, das comunidades e a sustentabilidade de cada pessoa. Hoje mais da metade da humanidade não tem sustentabilidade porque passa fome e morre antes do tempo. O documento diz: para garantir a sustentabilidade temos que ter um outro olhar sobre a natureza e a relação que o ser humano deve de ter com a natureza. Daí que o eixo estruturador de todo o documento é um modo sustentável de vida. Cada um tem que ter um modo sustentável de vida. Dizer em linguagem bem pequenina: cada um tem que pagar as suas contas, não pode depender da bolsa escola, da fome zero, tudo isso é política compensatória (Aplausos).
Devemos conseguir que todos os seres, que cada um de nós tenha um modo de vida sustentável. Cada um sabe a sua medida, cada cultura, cada região, esse é o grande nó. E procura, nessa perspectiva, alargar o horizonte da ecologia sustentada por quatro grandes princípios. O primeiro é: Respeitar e cuidar da comunidade de vida. Veja, não diz respeitar o meio ambiente; respeitar e cuidar da comunidade de vida. Segundo: Manter integridade ecológica. Quer dizer que toda natureza possa ser mantida na sua riqueza, na sua beleza, na sua diversidade. Por isso há uma briga severa com as monoculturas. O Brasil é o país da monocultura mundial: monocultura da soja, monocultura da cana, monocultura dos cítricos, que é um grande crime ecológico contra a diversidade da natureza. É a nossa voracidade acumuladora que nos leva a ter monocultura. Mas ela não fica só na monocultura da produção, é a monocultura do pensamento, só neoliberalismo. A monocultura do capitalismo, só modo de produção capitalista, e não no modo como o MST postula: cooperativo, misto, familiar, social, etc, e contra as monoculturas, fazer a grande diversidade. Terceira grande pilastra: justiça social e economia. Isso pertence à ecologia porque afeta ao ser mais complexo da natureza que é o ser humano. A natureza não está lá, está aqui. E toda injustiça social é uma injustiça ecológica contra o ser humano, contra as águas poluídas, contra os solos envenenados, contra o ar empesteado (Aplausos). E por fim, democracia, não violência e paz. Veja, pensar ecologia em termos de democracia, não só dos seres humanos, mas de todos os seres vivos. Quem sabe num próximo FSM nós viemos aqui, não só como pensador, como artista, viemos com o nosso gato, com o nosso cachorro, nosso papagaio, e nossos irmãos e irmãs poderem participar disto (Aplausos) - só que a Letícia vem com um caixão enorme com todos os gatos que ela tem lá em casa (Viva São Francisco! diz Letícia Sabatella). Portanto, a democracia, não violência e paz. Como vêem, essas pilastras todas fundam uma nova ótica da realidade e essa nova ótica dá origem a uma nova ética.
Não existe ética nenhuma que não suponha uma ótica diferente. Nós teremos um olhar diferente da natureza, do lugar do ser humano. A ecologia engloba tudo isso como a própria palavra diz: ecologia - a casa comum. Só que a casa não é essa tenda, não é o apartamento que nós temos, ou a casa onde moramos. Hoje a casa é o planeta Terra. Nós não temos outra casa para morar, só temos essa casa comum. Com recursos limitados, com superpopulação e uma das espécies entre tantas as espécies de seres vivos que tem, uma das espécies, que somos nós, ocupou para si 83% do planeta e expulsou as demais espécies. Acantonou, perseguiu, matou. A cada treze minutos desaparece uma espécie de vida, definitivamente, dada a voracidade do processo industrialista, do consumismo e do nosso descuido. Então, como conservar esse planeta no qual todos possam ser incluídos, a natureza, inclusive. Que não haja ninguém excluído. Mais da metade da humanidade está excluída, na margem, empurrada para o abismo. O sistema, se pudesse mandar os pobres para a lua, os teria mandado há muito tempo, para perecerem naquela aridez. Eles não cabem aqui. São os zeros econômicos. Não produzem quase nada, não consomem quase nada, por isso que as igrejas da libertação fizeram a opção preferencial pelos povos contra a pobreza, fizeram a opção absurda pelo sistema, por aqueles que não compram, que não são, que não consomem, que o sistema considera “sobrantes”. Esses, nós dizemos: são os primeiros a receber um cuidado, de ter a centralidade do zelo e da preocupação das pessoas humanistas, que vem da tradição religiosa ou espiritual da humanidade.
Bom, eu não quero me alongar muito porque todo mundo está com fome, mas eu quero falar de dois princípios fundamentais que são de uma profunda compreensão ética, humanista, ecológica que sustentam o documento todo. O princípio da sustentabilidade e o princípio do cuidado. Eles libertam a sustentabilidade de sua vinculação com o desenvolvimento. Como se sabe, o desenvolvimento vem da área da economia, da economia capitalista que prevê um desenvolvimento sem fim, ilimitado, ininterrupto, e que supõe que a Terra tem recursos infinitos, um baú que nunca se acaba. Já Gandhi nos anos cinqüenta e Chirac, abrindo a Rio + 10 em Johannesburg, disse: Se nós, países ricos, quisermos universalizar o desenvolvimento que nós temos, nós precisamos de outras três Terras iguais a essa, três Terras a mais. Lógico, não existe essas três Terras. Então, esse modelo de desenvolvimento não é universalizado, não é democratizado, não é socializado.Temos que nos inserir aí. Mas, ele é dominante, ele que obriga as classes, marginaliza países e devassa a natureza, então, deixamos essa compreensão de desenvolvimento e resgatamos a sustentabilidade que vem da área da biologia, que vem da área da ecologia, e que sustenta que todos os seres entretêm entre si, relações de inter-retro dependência. Um ajuda o outro, sempre co-evoluem juntos, mantém o equilíbrio dinâmico, aberto, de tal maneira que ninguém é sacrificado, mas todos têm o seu lugar no conjunto da natureza. Então, sustentabilidade só pode ser aplicada ao desenvolvimento se garantirmos antes que a Terra seja sustentável, que as vidas humanas tenham sustentabilidade, que as comunidades onde nós estamos inseridos sejam sustentáveis. Se garantirmos isso, o nosso desenvolvimento será sustentável. Então, o desenvolvimento sustentável supõe coisas antes que o documento até diz: pré-condição para que haja desenvolvimento sustentável entre outras coisas - isso vai agradar vocês mulheres, pré-condição é que haja igualdade, e eqüidade com as mulheres (Aplausos). Se não houver isso (Aplausos), e com razão, porque as mulheres são mais da metade da humanidade, e são as irmãs e mães da outra metade, então são importantíssimas (risos). Não dá para excluí-las, e entenda, a sustentabilidade já é um conceito assimilado pela nossa cultura, e a sustentabilidade é aquela relação que entretemos com a natureza que garante a satisfação de nossas necessidades: temos que comer, beber e nos alimentar. Então, garante, sem sacrificar o capital natural, isto é, permitindo que as águas se reproduzam, que as coisas se regenerem, sem sacrificar o capital natural, e abertos às gerações que vem depois de nós: nossos filhos, nossos netos, eles têm direito de receber o planeta conservado, águas potáveis, ar respirável, instituições humanas minimamente justas, includentes, eles têm direito a isso.
Agora, se olharmos os relatórios que são publicados todos os anos sobre o estado da Terra, constatamos que todos os itens, sem nenhuma exceção, de ano em ano piora, todos os índices pioram, da devastação, da extinção das espécies, da diminuição da água, crescimento da violência no mundo, das discriminações. Então, temos que frear essa queda da expectativa de que a coisa pode mudar. Ela está piorando todos os dias. Há urgência de nos transformarmos nossos sonhos de um mundo possível, diferente, realmente, para que sementes novas comecem a produzir o novo. Então, a sustentabilidade existe, mas não só em termos econômicos de garantir o sustento, de garantir a beleza na natureza. Os camponeses são tão sensíveis a isso, mas como é bonito ver os animais, o nascer do sol, o por do sol, a lua, as plantas e florestas, os animaizinhos que nascem, manter a beleza natural, manter a integridade dela, fazer com que todas as espécies continuem, manter sua capacidade de regeneração, por que a Terra está cheia de chagas. Fazer que ela (...), criar condições, que os desertos voltem a ser férteis, que as florestas, matas ciliares junto aos rios, que foram derrubadas, possam voltar a manter a umidade e a alimentar as nascentes. Tudo isso está dentro da sustentabilidade, e os seres humanos estão numa relação de não violência, de cooperação, e não competitividade como é a lei do mercado do sistema. Tudo isso cabe dentro da sustentabilidade.
E o cuidado é o segundo eixo - já vou terminar - segundo eixo da relação fundamental de preservação dessa herança fantástica, que dá garantia de que ela pode continuar, porque a relação que nós entretemos com a natureza é uma relação de agressão: nós cortamos, nós derrubamos, nós fazemos mil coisas com a natureza no paradigma da modernidade, dos quais, fundadores do método científico como Descartes, Francis Baccon, primeiro formulador do método da ciência, dizem que devemos tratar a Terra como o inquisidor do Vaticano trata seu inquirido – bom, eu tenho uma pouca experiência nisso (risos) - deve torturá-lo. Ele diz: deve torturar a Terra até que ela entregue todos os seus segredos. Então, a relação da ciência moderna, da nossa indústria, é torturar a Terra, é massacrar você. Evitando essa relação de violência, de não alteridade, de não respeito, introduzir o cuidado. O cuidado é uma relação amorosa para a vida, é não agressiva, é abrir-se generosamente ao outro, acolher e respeitá-lo na sua diferença. Então, estabelecem a pedagogia do cuidado para a vida, para os ecossistemas, nas relações entre as pessoas. O cuidado supera as classes, inclui todos numa perspectiva de irmão e irmã e igualdade. E o cuidado é aquela pré-condição que garante que as coisas dêem certo. Tudo aquilo que a gente cuida dura muito mais, desde a nossa camisa, nosso óculos, até a dentadura dura mais – a minha está quase pulando fora daqui (risos). Com o cuidado se encurta a lei da entropia que é a lei do desgaste natural das coisas. Então, o cuidado está ligado à essência da vida. Se nossas mães não tivessem tido um cuidado incondicional quando nós nascemos, nós não estaríamos aqui para falar dessas coisas todas. Nós somos filhos e filhas do cuidado, e termino: a conseqüência dessa visão nova e integradora é a que se estabelecem três metas: cuidar com compreensão da natureza e de todos os seres, cuidar com compaixão, não deixar que ninguém sofra sozinho, e cuidar com amor, que é a relação mais afetiva, mais poderosa que o universo conhece, que é o amor que cria união, cria fusão, cria simpatia entre todos os seres, cria o abraço da afetividade. Cuidar com compreensão, com compaixão, com amor, traz como resultado a paz, que é talvez a definição melhor, que hoje a noite vou até ter que falar sobre isso (...) a paz, diz lá o documento: a paz é a plenitude da reta relação que resulta consigo mesmo, com o outro, com a natureza, com outras vidas que por acaso vierem de outros planetas, com a totalidade de todos os seres, com o todo que por detrás se esconde Deus. A relação correta com o todo ao qual eu pertenço e do qual eu sou parte com o céu. Então, a paz não pode ser buscada imediatamente. Ela resulta, ela é conseqüência de algo interior da reta relação com todas as coisas. E como tudo é relação e nada existe fora da relação porque tudo tem a ver com tudo em todos os pontos, em todos os movimentos, então é paz conosco, paz com a Terra, paz com as pessoas, paz com o universo, paz com Deus. É o anseio maior da humanidade: viver em paz. Então eu quero convidar a vocês a distribuírem essa carta, se quiserem entrar no site que é www.cartadaterra.org a secretaria em Costa Rica, a secretária geral que articula tudo isso é uma brasileira profundamente engajada Miriam Vilela. E nós temos um grupinho de 23 pessoas que estamos tentando, no mundo inteiro, fazer que cada país assuma isso, que os presidentes assinem, que os ministros e ministras ligados ao meio ambiente, à ecologia, incentivem, como fez o nosso irmão Pedro Ivo, que nos ajudou a fazer essa edição muito bonita que está distribuída entre vocês. Eu creio que aqui está um pouco a chave da salvação da Terra. Termino com um verso de Camões, que nós estamos dentro do olho de uma crise ecológica mundial. Então Camões, depois de olhar todos os riscos que ele correra, quase se afogando no mar diz: “Depois de procelosa tempestade, sombria noite e sibilante vento, traz a manhã serena claridade, esperança de porto e salvamento”. Muito obrigado!
Para saber mais sobre o trabalho de Leonardo Boff e a Carta da Terra:
www.leonardoboff.com

domingo, 14 de março de 2010

CIDADÃO DE PAPEL

O Cidadão de Papel
De Gilberto Dimenstein

Capa-do-livro-O-cidadao-de-papel

Brasil, país de grandes juristas e legisladores. Brasil, país em que os processos correm na justiça por anos a fio sem que, muitas vezes, se chegue a um termo satisfatório.

Brasil, onde temos presenciado e participado nos últimos anos de grandes e benéficas modificações na educação. Brasil, onde há crianças que ainda não conseguem chegar a escola e outras que, mesmo estando lá, saem sem que tenham aprendido muita coisa.

Brasil, pátria pródiga na produção de alimentos, um dos celeiros do mundo, o maior produtor e exportador mundial de açúcar, café, soja, frango e laranja. Brasil onde muita gente ainda passa fome e o governo tenta implementar políticas sociais de resgate da cidadania, como o "Fome Zero".

Brasil, local de nascimento de grandes expoentes das artes e do esporte como Tom Jobim, Jorge Amado, Tarsila do Amaral, Maria Esther Bueno, Pelé ou Ayrton Senna. Brasil, onde milhares de crianças são condenadas diariamente a vagar pelos sinais, por bares, por prostíbulos e tantos outros lugares deprimentes em busca da sobrevivência.

O livro "O Cidadão de Papel", do jornalista Gilberto Dimenstein, produzido nos primeiros anos da década de 1990, nos apresentou esse país de contrastes tão grandes. Uma das maiores economias do planeta e, ao mesmo tempo, um dos lugares mais socialmente injustos para se morar. As notícias divulgadas nos jornais todos os dias, vistas por muitos de nós como contingência de um sistema, ou seja, como algo contra o qual não adianta lutar, constituem a base e a referência para esse exame minucioso.

Dimenstein procurou focar sobre as questões sociais e seu impacto na vida dos pequenos brasileiros, das crianças.

Partiu da Declaração Universal dos Direitos Humanos e nos mostra, ao longo das páginas de seu livro, como estamos distantes da aplicação prática de elementos básicos e fundamentais para que possamos conceder a nossas crianças e jovens um mínimo de dignidade.

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Os lixões e a falta de moradia são dois flagelos que persistem no
cotidiano de muitas famílias e crianças brasileiras.

Círculo Vicioso

dignidade . [Do lat. dignitate.] S. f. Respeito a si mesmo; amor-próprio, brio, pundonor (Sentimento de dignidade; brio, honra, decoro).

Quando falamos em dignidade em termos práticos abordamos questões como educação, habitação, alimentação, saúde, lazer, trabalho, consideração e respeito.

Se falta dinheiro para conseguir comida, muitas famílias colocam seus filhos nas ruas e exigem que eles consigam, de alguma forma, obter os recursos necessários e, ao voltar para casa (quando ela existe), contribuir com os pais e irmãos.

Se a criança está na rua, engraxando sapatos, vendendo balas nos semáforos das grandes metrópoles, se prostituindo nas esquinas mais movimentadas dos grandes centros urbanos, catando restos em lixões, cometendo pequenos furtos ou cheirando cola, ela definitivamente está muito longe de onde realmente deveria estar, a escola.

Se a escola não é parte constante da realidade de uma criança ou de um adolescente, as probabilidades dessa criança ter boas chances no futuro são ínfimas, ou seja, extremamente reduzidas. Sem livros, alimentos, interação com professores e colegas num ambiente arejado e saudável, é pouco provável que essa pessoa consiga abandonar as ruas, se integrar ao mercado de trabalho, formar família, prover suas necessidades de forma adequada ou mesmo obter respeito próprio.

"O Cidadão de Papel" nos mostra como, apesar da Declaração Universal dos Direitos Humanos e de todos os modernos códigos legais que regem o nosso país (da Constituição ao Código Civil, do Código Penal ao Código do Consumidor, passando por tantos outros), o Brasil não conseguiu vencer a chaga da desigualdade social e da péssima distribuição de renda.

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Apesar das Declarações de Direitos e Códigos de Leis, ainda estamos muito longe de
atingir uma situação de justiça social, por isso a cidadania ainda não saiu do papel...

Atualíssimo

Já se passaram mais de dez anos desde a publicação do livro de Dimenstein. Os ares da democracia se estabeleceram no país (vencemos o autoritarismo e a ditadura), os mandatos presidenciais de Fernando Henrique Cardoso e Luis Inácio Lula da Silva tem realizado notáveis progressos em diversos setores, especialmente na estabilização da economia, entretanto, as contundentes afirmações do "Cidadão de Papel" continuam a assombrar o Brasil.

Quem lê o livro hoje não vê grande diferença entre o que se passava no país a dez ou doze anos atrás em relação ao que acontece hoje, nos anos iniciais de um novo século (e milênio).

Há muitas crianças nas ruas. O maior e mais divulgado projeto governamental é o Fome Zero (o que demonstra que o flagelo da subnutrição e da desnutrição, causados pela miséria, continua existindo no Brasil). A violência se alastra. Muitas crianças ainda estão fora da escola. Postos de saúde e hospitais continuam lotados (povo doente é sinal de má alimentação, falta de instrução, pobreza). Os lixões ainda constituem fonte primordial de trabalho e sustento de muitas famílias...

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O que fazer?

"O Cidadão de Papel" tem fomentado discussões e debates, portanto tem cumprido seu papel. A partir de suas páginas foram montadas peças teatrais. O valor do trabalho foi reconhecido com láureas importantes como o prêmio Jabuti (um dos mais importantes da literatura nacional) em 1993. Nas escolas tem sido utilizado e lido por vários professores e alunos, tanto na rede pública quanto na privada.

O primordial passa a ser transformar toda a indignação e insatisfação com o que lemos nas páginas dessa obra em ações que revertam benefícios para a comunidade em que vivemos.

Isso significaria, por exemplo, organizar os estudantes para ações como coletas de alimentos, doação de livros, campanhas de agasalhos, atividades culturais que abordassem os temas e incentivassem uma maior solidariedade, visitas a instituições que prestam auxílio a crianças carentes,...

Tenho certeza que isso já está acontecendo. Falo por experiência própria. Adotei o livro logo que ele foi lançado. Acompanhei suas atualizações. Discuti vários tópicos com os alunos. Organizamos projetos e trabalhos. Mesmo que com alcance regional, colhemos frutos. Dedicamos o pouco que fizemos a leitura de "O Cidadão de Papel", queremos apenas que em muitas outras cidades aconteça o mesmo...

domingo, 28 de fevereiro de 2010

AQUECIMENTO GLOBAL

Perguntas & Respostas

Junho de 2007
Aquecimento Global



O alerta dos cientistas sobre o aquecimento global e suas conseqüências, que há poucos anos mobilizava apenas órgãos técnicos de governos e ambientalistas, hoje se tornou um tema onipresente. O combate ao aumento do efeito estufa está na retórica dos políticos e nos planos de negócios dos empresários. Virou ferramenta de marketing na publicidade e de autopromoção entre celebridades. Em todo o mundo, a possibilidade de ocorrerem catástrofes cada vez mais devastadoras por causa da elevação da temperatura no planeta é tema obrigatório nas rodas de conversa. Entenda por que o planeta esquenta, e o que a elevação da temperatura pode fazer com ele.


1. O que é o efeito estufa?
2. A emissão desses gases está aumentando?
3. Quais são os maiores emissores de gases do efeito estufa?
4. Quais são as evidências do aquecimento do planeta?
5. Quanto a temperatura pode subir?
6. Os atuais modelos de previsão de clima são confiáveis?
7. Quais serão os principais efeitos do aquecimento?
8. Quais países serão mais afetados?
9. Quais espécies animais serão mais afetadas?
10. Como impedir um aquecimento global exagerado?
11. Qual a importância do Protocolo de Kioto para conter o aquecimento?

1. O que é o efeito estufa?

O efeito estufa é o fenômeno natural pelo qual a energia emitida pelo Sol - em forma de luz e radiação - é acumulada na superfície e na atmosfera terrestres, aumentando a temperatura do planeta. De suma importância para a existência de diversas espécies biológicas, o efeito estufa acontece principalmente pela ação de dióxido de carbono (CO2), CFCs, metano, óxido nitroso e vapor de água, que formam uma barreira contra a dissipação da energia solar. A maioria dos cientistas climáticos crê que um aumento na quantidade desses gases provoca uma elevação da temperatura da Terra.

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2. A emissão desses gases está aumentando?

Com o desmatamento e a queima de combustíveis fósseis cada vez mais intensos, a concentração desses gases está aumentando, especialmente as de CO2 e metano. Desde 1800, a concentração de dióxido de carbono na atmosfera cresceu 30%, enquanto a de metano aumentou 130%. Analisando camadas de gelo da Antártica, cientistas europeus descobriram que o ritmo de aumento na concentração de CO2 é impressionante: nos últimos 150 anos, o gás propagou-se pela atmosfera do planeta cerca de 200 vezes mais rápido que nos últimos 650.000 anos.

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3. Quais são os maiores emissores de gases do efeito estufa?

Os maiores emissores de gases responsáveis pelo efeito estufa são Estados Unidos, União Européia, China, Rússia, Japão e Índia. Entre essas nações, os Estados Unidos - responsáveis por cerca de 36% do total mundial - lideram as emissões tanto em termos absolutos como per capita. Entre 1990 e 2002, os EUA aumentaram em 15% o nível de emissão de gases, chegando a 6 bilhões de toneladas ao ano. Para efeito de comparação, todos os países membros da UE emitiram, juntos, cerca de 3,4 bilhões em 2002. A China, terceira colocada no ranking, emitiu 3,1 bilhões de toneladas.

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4. Quais são as evidências do aquecimento do planeta?

Há diversas evidências de que a temperatura global aumentou. Os termômetros subiram 0,6°C entre meados do século XIX e o início do século XXI - desses, 0,5°C apenas nos últimos 50 anos. Outra evidência é a elevação de 10 cm a 20 cm no nível dos oceanos nesse período. Além disso, as regiões glaciais do planeta estão diminuindo: em algumas zonas do Ártico, por exemplo, a cobertura de gelo encolheu até 40% em décadas recentes. Cientistas também consideram prova do aquecimento global a diferença de temperatura entre a superfície terrestre e a troposfera - zona atmosférica mais próxima do solo.

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5. Quanto a temperatura pode subir?

Os atuais modelos científicos prevêem que, se nada for feito, a temperatura global pode aumentar entre 1,4°C e 5,8°C até 2100. Cientistas menos otimistas acreditam que a temperatura de certas áreas do globo pode subir até 8°C no período, e que, mesmo com um corte radical na emissão de gases, os efeitos do aquecimento continuarão. Isso porque são necessárias décadas para que as moléculas dos gases que já estão na atmosfera sejam desfeitas e parem de acumular energia solar em excesso.

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6. Os atuais modelos de previsão de clima são confiáveis?

Os debates em torno da eficácia e precisão dos atuais modelos de previsão climática são acalorados. Uma minoria científica crê que os sistemas computadorizados são demasiadamente simplificados, incapazes de simular as complexidades do clima real. Porém, a maior parte comunidade científica mundial defende que as atuais análises feitas em computador, apesar de precisarem ser aperfeiçoadas, já são confiáveis para simulações de futuro próximo - intervalos de 25 ou 30 anos.

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7. Quais serão os principais efeitos do aquecimento?

Os cientistas climáticos são unânimes em afirmar que o impacto do aquecimento será enorme. A maioria prevê falta de água potável, mudanças drásticas nas condições de produção de alimentos e aumento no número de mortes causadas por inundações, secas, tempestades, ondas de calor e fenômenos naturais como tufões e furacões. Além disso, pesquisadores europeus e americanos estimam que, caso as calotas polares derretam, haverá uma elevação de cerca de 7 metros no nível dos oceanos. Outro impacto provável é a extinção de diversas espécies animais e vegetais.

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8. Quais países serão mais afetados?

Apesar de os grandes responsáveis pelo aquecimento global serem as nações desenvolvidas da América do Norte e Europa Ocidental, os chamados países em desenvolvimento serão os que mais sentirão efeitos negativos. Isso acontecerá porque essas nações possuem menos recursos financeiros, tecnológicos e científicos para lidar com os problemas de inundações, secas e, principalmente, com os surtos de doenças decorrentes. A malária, por exemplo, deve passar a matar cerca de 1 milhão de pessoas ao ano com o aquecimento do planeta.

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9. Quais espécies animais serão mais afetadas?

Segundo as estimativas da Convenção das Nações Unidas para Mudanças do Clima (UNFCCC), a maioria das espécies atualmente ameaçadas de extinção pode deixar de existir nas próximas décadas. As projeções indicam que 25% das espécies de mamíferos e 12% dos tipos de aves seriam totalmente banidos do planeta com o aumento da temperatura, que provocaria mudanças drásticas principalmente nos frágeis ecossistemas florestais e pantanosos.

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10. Como impedir um aquecimento global exagerado?

Cientistas e engenheiros defendem que a solução para o aquecimento global exagerado está no desenvolvimento de tecnologias energéticas que emitam menos dióxido de carbono. Entre as mais pesquisadas atualmente estão a fissão nuclear, células combustíveis de hidrogênio, desenvolvimento de motores elétricos e também o aprimoramento de motores à combustão pela diminuição do consumo e pela diversificação de substâncias combustíveis. No Brasil, ganha destaque o desenvolvimento de matrizes energéticas de origens vegetais, como o etanol, o biodiesel e também o Hbio.

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11. Qual a importância do Protocolo de Kioto para conter o aquecimento?

O protocolo de Kioto - que entrou em vigor em fevereiro de 2005 e conta com a participação de 163 nações - prevê que até 2012 seus signatários reduzam as emissões combinadas a níveis 5% abaixo dos índices de 1990. A eficácia do acordo, contudo, é limitada, pois até o momento os Estados Unidos, maior emissor mundial de dióxido de carbono, não ratificaram o pacto. Especialistas acreditam que as resoluções de Kioto apenas combatem a camada mais superficial do problema do aquecimento global.

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